Em prancha anterior, buscamos demonstrar que o maior problema da Saúde Pública no Brasil, se deve à Falta de Investimentos e Decisão Político-social. Até mesmo os valores destinados ao setor pelo Orçamento Anual não foram utilizados em sua totalidade, senão desviados. O Brasil destaca-se internacionalmente como um dos mais baixos investimentos na Saúde per capita das Américas no ano de 2013. Neste mesmo ano, ainda no governo Dilma, o investimento foi de US$ 523,00 per capita, talvez o ano de menor investimento da história do país, mesmo diante do clamor da população desassistida e de todos os problemas decorrentes da má administração e desatenção ao setor.
Seguramente, o caos da Saúde brasileira, exposto na realidade dos Hospitais sucateados, na eliminação de milhares de leitos hospitalares a título de economia, na falta de um plano de carreira para os médicos e de seus baixos salários, dos valores pífios e irrisórios pagos pelo SUS às Instituições, além do despreparo dos profissionais formados pela inadvertida abertura de inúmeras Faculdades de Medicina, sem a capacidade mínima de formação ideal destes profissionais, somado uma campanha sistemática de formação de opinião popular que a falta de médicos é a responsável pelos problemas da Saúde no Brasil.
Em uma articulação político-partidária, evidenciando despreparo administrativo e a transferência de responsabilidades surge, então, o “Programa Mais Médicos”, instituído pela Lei 12.871/13 promulgada pela Sra. Dilma Rousseff, então Presidente da República do Brasil.
Este programa, Introduziu regras que afetam diferentes dimensões da Saúde e do exercício da Medicina no Brasil com impacto sobre atendimento, ensino dos futuros profissionais, formação dos especialistas e gestão/controle de atividades relacionadas. Foi seu objetivo prover e fixar médicos, em sua maioria intercambistas, na área da Atenção Básica. O projeto apontou como prioritárias as regiões carentes (distantes, pobres ou com dificuldade de fixação de profissionais), no entanto, não foi esse o roteiro de implementação seguido pelo Governo. Teve seu início em outubro de 2013.
Em Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgada em março de 2015, observou-se diversas distorções que permitiram diversas conclusões e algumas destacamos:
- . De 13.790 inscritos, 4.375 (31,7%) não possuíam supervisores indicados para avaliar desempenho e conduta profissional;
- As referências de maior gravidade surgiram quando 17,7% dos “supervisionados“, ao entrarem em contato com seus supervisores para dirimir dúvidas, admitiram que a falta de conhecimento dos protocolos clínicos conturbou diagnósticos e terapêuticas;
- O pagamento feito de forma indireta – via OPAS– conflita com a legislação brasileira, conforme o Ministério Público, além de que após as transferências ao Governo Cubano, apenas 10% dos valores eram repassados aos profissionais;
- Desrespeito à exigência de revalidação para permitir a atuação de estrangeiros no Brasil;
- Muitos intercambistas não tiveram documentos traduzidos e não comprovaram domínio da língua portuguesa;
- A distribuição dos intercambistas não atendeu aos propósitos da Lei, com forte presença do grupo em capitais, municípios desenvolvidos e onde já existia número importante de médicos;
- 34,3% dos “supervisores” afirmaram que os médicos formados no exterior enfrentaram obstáculos devido ao desconhecimento de protocolos, com relatos de dificuldades na definição dos nomes de medicamentos e de dosagens;
- A auditoria mostra que em 49% dos primeiros locais atendidos pelo Programa, ao receberem os bolsistas, ocorreu a dispensa de médicos contratados anteriormente;
- Em agosto de 2013, nesses municípios com redução da oferta de serviços médicos havia 2.630 médicos, que, somados aos 262 profissionais que chegaram pelo Mais Médicos, totalizavam 2.892 médicos. Em abril de 2014, porém, contabilizou-se apenas 2.288 médicos;
- De acordo com a auditoria, houve diminuição das consultas médicas em 25% dos municípios cadastrados e uma distribuição de intercambistas sem prioridade às áreas de pouca ou nenhuma assistência.
Ainda que discutível a necessidade de profissionais estrangeiros em nosso país, certamente são bem-vindos, desde que com diplomas revalidados, qualificados, capacitados tecnicamente e com boa formação humanística. Sua admissão, e para todos os que obtiveram diplomas em outros países, deve ser submetida e aprovada pelo Revalida (exame criado pelo Governo e que mede de forma isenta conhecimentos, capacidades e competências).
Obstados pelos órgãos classistas brasileiros, inconformados com as evidentes distorções existentes neste Projeto, em ato autoritário e inédito, o Governo define o Ministério de Saúde como o órgão autorizado a referendar o exercício destes profissionais, suprimindo dos Conselhos o direito indiscutível de fiscalização da classe profissional médica.
Apesar da adesão de brasileiros ao Programa, não há milagres. É preciso que o Estado ofereça condições de trabalho adequadas ao atendimento eficaz. Os postos de saúde e hospitais precisam de boa estrutura, equipamentos, insumos e equipes multidisciplinares que atuem de forma integrada em prol do cidadão, em sistema de referência e contra-referência.
Qualquer profissional, seja de que área for, necessita de um mínimo para exercer sua função… E o mais importante: nós lidamos com vidas, e não com política.
É dever estatutário da AMEM-BRASIL abrir uma frente de luta contra estas agressões… Precisamos encontrar soluções para reduzir, senão evitar, estas violências. Devemos nos organizar e somar esforços junto aos órgãos classistas, CFM e CRMs para o livre e digno exercício de nossa profissão. Somente com a união de todos isto será possível.